A Política Laboral da Companhia de Moçambique

As autoridades coloniais portuguesas viam no trabalho africano dos maiores recursos que as colónias possuíam e um recurso cujo valor podia ser facilmente arrecadado.

As autoridades portuguesas com a abolição da escravatura vêem-se num dilema no que diz respeito à gestão e controlo de mão-de-obra, pois era preciso garantir a força de trabalho necessária para continuar com a exploração. Assim, foram elaborados instrumentos legislativos que preconizavam o controlo da força de trabalho sem recorrer a um sistema de escravatura aberto.

O Código de Trabalho apresentado por António Enes, em 1899 defendeu a justeza legal da força de trabalho africano, conhecido pelo nome de chibalo, onde todos os camponeses africanos eram obrigados a procurar e a adquirir pelo trabalho os meios que necessitavam para a subsistência e para elevar o seu nível de vida.

 

“Não há que ter escrúpulos em obrigar, forçar esses rudes negros de África a trabalhar, a Civilizarem-se a si mesmos através do trabalho.”

Para Enes, obrigar os negros a trabalhar não era motivo de vergonha, muito pelo contrário, era uma obra de civilização.

António Enes, 1899

 

O domínio e exploração do trabalho assalariado nas plantações, farms, explorações mineiras e outros sectores da economia colonial constituíam formas de desenvolvimento do capitalismo colonial. Assim, o trabalho assalariado para os camponeses não Constituía a única fonte de sobrevivência, pois tinham as suas machambas, onde cultivavam alimentos para si e suas famílias. Enquanto os camponeses tivessem a sua terra para cultivar, não se interessavam pelo trabalho assalariado, O campesinato não tinha uma motivação para as solicitações de trabalho assalariado. Por isso, a Companhia de Moçambique teve de utilizar outros métodos para garantir o fornecimento de mão-de-obra a preços baixos. Sem esta mão-de-obra era impossível garantir o desenvolvimento da economia colonial. A primeira medida tomada, como forma de garantir o trabalho assalariado, foi a institucionalização do imposto em dinheiro. Assim, os camponeses eram obrigados a trabalhar para obterem o dinheiro para o pagamento de impostos.

A principal legislação de trabalho aprovada pelo Governo português para o território foi:

·         O Regulamento Geral do Trabalho dos Indígenas no Território da Companhia de Moçambique;

·         O Regulamento para o Fornecimento de Indígenas a Particulares no Território de Manica e Sofala;

·         E o Regulamento para o Recrutamento de Indígenas de Manica e Sofala.

Estes regulamentos assentavam em três aspectos essenciais: a institucionalizaçac do trabalho forçado; o sistema de controlo rigoroso da força de trabalho; e a interdição de recrutamento para serviços fora do território.

Aspectos essenciais dos regulamentos sobre o trabalho na Companhia de Moçambique:

Institucionalização do trabalho forçado

— Obrigava todas as pessoas em idade activa a prestarem o trabalho assalariado;

— O camponês era obrigado ou a vender de forma coerciva a sua força de trabalho ou a dedicar-se a culturas viradas para a exportação em benefício do capital estrangeiro;

— Esta situação criava, no seio do núcleo familiar, uma grande instabilidade, pois prejudicava o desenvolvimento da economia familiar de subsistência.

O sistema de controlo rigoroso da força de trabalho

— Cada trabalhador devia ser portador de um certificado onde estivesse patente o tempo de serviço prestado à companhia e as datas de início e de termo do contrato;

— Entre 1926-27 é instituído o regime de Caderneta de Identificação Indígena para os indivíduos do sexo masculino com idade aparente ou provada superior a 14 anos;

— Desde então, todos os indivíduos eram obrigados a circular com esta caderneta individual;

— Na caderneta registavam-se os contratos de trabalhos cumpridos e a sua história criminal;

— Os chefes de circunscrição e os seus subordinados, régulos ou inhacuacua, chefes de povoação ou fumos, sipaios e outros auxiliares foram obrigados a implementar rigorosamente este regime de caderneta;

— O recenseamento colonial passou também a constituir um instrumento de controlo do pagamento dos impostos e do trabalho forçado.

Interdição de recruta mento para serviços fora do território

— O recrutamento da mão-de-obra devia ser feito dentro do território da companhia;

— A emigração clandestina era proibida;

— Para impedir a fuga dos trabalhadores para fora do território foi imposto um policiamento rigoroso nas fronteiras;

— A aplicação destas medidas serviram para a companhia reduzir o problema da falta da mão-de-obra, mas promoveu o pagamento de salários baixos, mesmo aos trabalhadores classificados como “voluntários”;

— Consequências destas medidas: fugas para os países vizinhos ou outras zonas da colónia; adopção por parte dos camponeses de nomes falsos; falta de mão-de-obra e a revolta de Barué de 1905 e 1917 contra a presença colonial.

 

Para fazer face à crise de mão-de-obra, João Pery de Lind, em 1911, criou a Repartição do Trabalho Indígena, RTI, cuja finalidade era a centralização da procura e da oferta de mão-de-obras João Pery convenceu os farmeiros a aceitarem trabalhadores provenientes dos distritos de Moçambique, Tete e Zambézia, além da mão-de-obra recrutada localmente.

Com o Estado Novo foi decretado a 6 de Dezembro de 1928 o Código do Trabalho Indígena, que impunha como dever moral para cada cidadão procurar trabalho, mas era contrário ao trabalho obrigatório para fins exclusivamente privados.

 

Conclusão

Terminada a abordagem, pôde concluir-se que o capitalismo colonial só se podia desenvolver através do domínio e exploração do trabalho assalariado nas plantações, na (farms), exploração mineira e outros sectores da economia. Com tudo, os camponeses possuindo meios de vida próprios, não tinham no trabalho assalariado a sua fonte de sobrevivência. Desta forma, para conduzir o camponês ao trabalho assalariado, a companhia usou a violência extra-económica capaz de arrastar a força de trabalho de campisenato.

É de salientar que de uma forma comprimida, a Companhia de Moçambique consistia em exploração dos territórios e da população que estavam sob seus domínios; colectar taxas e impostos de palhota e de capitação (mussoco); exploração de mão-de-obra para países vizinhos; construir e explorar vias de comunicação; conceder terras a terceiros; privilégios bancários e fiscais (emitir moedas e selos).

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