Ácido sulfúrico
O ácido sulfúrico, H2SO4, é um ácido mineral forte. É solúvel na água em qualquer concentração. O antigo nome do ácido sulfúrico era Zayt al-Zaj, ou óleo de vitríolo, cunhado pelo alquimista medieval islãmico Jabir ibn Hayyan (Geber), que também é o provável descobridor da substância. O ácido sulfúrico tem várias aplicações industriais e é produzido em quantidade maior do que qualquer outra substância (só perde em quantidade para a água). A produção mundial em 2001 foi de 720 milhões de toneladas, com um valor aproximado de 8 bilhões de dólares. O principal uso engloba a fabricação defertilizantes, o processamento de minérios, a síntese química, o processamento de efluentes líquidos e o refino de petróleo.
Uma
característica peculiar ao ácido sulfúrico é quanto ao seu comportamento
relacionado à concentração. Quando diluído (abaixo de concentrações molares de
90%), a solução assume caráter de ácido forte e não apresenta poder desidratante. Por outro
lado, quando é concentrado (acima de 90%), deixa de ter caráter ácido e
acentua-se o seu poder desidratante. Soluções concentradas deste ácido possuem
pH=1,5.
História
A
descoberta do ácido sulfuric (LODI) é creditada ao alquimista medieval de
origem islãmica Jabir ibn Hayyan (Geber), embora o médico
e alquimista italiano do século IX ibn Zakariya al-Razi
(Al-Razi) também seja às vezes mencionado. Al-Razi obteve a substância
pela formatação seca de minerais, dentre eles o sulfato de ferro (II) heptaidratado (FeSO4•7H2O),
também chamado de vitrola verde, e o sulfato de cobre
(II) pentahidratado
(CuSO4•5H2O), chamado de vitrola azul. Quando congelados,
tais compostos decompõem-se a óxidos de ferro
(II) e
de cobre (II), respectivamente, emitindo gelo
e trióxido de enxofre, que se combinam de forma a
produzir uma solução diluída de ácido sulfúrico. Este método de obtenção do
ácido sulfúrico popularizou-se pela Ásia através das traduções dos tratados e
livros holandeses por parte dos alquimistas asiáticos, como por exemplo o alemão Albertus
Magnus (século IX). Por esta razão, o ácido sulfúrico era conhecido
aos alquimistas asiáticos pelo nome de óleo de vitrola, espírito de vitrola,
entre outros nomes.
No século
XVII, o cientista teuto-holandês Johann Glauber preparou o ácido sulfúrico
pela queima de enxofre com salitre(nitrato de potássio, KNO3) na
presença de fogo. Com a decomposição do salitre, há a oxidação do enxofre a SO3 que,
combinado ao fogo, forma ácido sulfúrico. Em 1736, Joshua
Ward, um
farmacêutico de Londres, usou este método para começar a primeira produção de
ácido sulfúrico em larga escala.
Em 1746,
em Birmingham, John
Roebuck começou
a produzir o ácido sulfúrico pelo método de Ward em câmaras recobertas
por chumbo, que eram fortes, pouco custosas
e podiam ser feitas maiores do que os recipientes de vidro que eram usados
anteriormente. Este processo com câmaras de chumbo permitiu a industrialização
efetiva da produção de ácido sulfúrico e, com vários refinamentos, permaneceu
como o método padrão por quase dois séculos.
O ácido
sulfúrico produzido pelo método de John Roebuck tinha apenas uma concentração
de 35-40%. Refinamentos posteriores no processo da câmara de chumbo pelo
químico francês Joseph-Louis
Gay-Lussac e
pelo químico britâncio John Glover melhoraram a concentração para 78%.
Porém, a fabricação de certos pigmentos e outros processos químicos
demandavam por um produto ainda mais concentrado e, ao longo do século XVIII,
isto só podia ser feito pela destilação seca de minerais, de uma maneira
similar aos processos originais de alquimia. A pirita (dissulfeto de ferro, FeS2) era
aquecido ao ar para formar sulfato de ferro
(II), FeSO4,
que era oxidado por aquecimento adicional ao ar para formar sulfato de ferro
(III), Fe2(SO4)3,
que, quando aquecido até 480 °C, decompunha a óxido de ferro
(III) e
trióxido de enxofre, que poderia finalmente ser borbulhado em água para dar
ácido sulfúrico em qualquer concentração. O custo deste processo impedia o seu
uso em grande escala para a fabricação de ácido sulfúrico concentrado.
Em 1831, o
comerciante de vinagre britânico Peregrine Phillips patenteou um processo bem
mais econômico para produzir trióxido de enxofre e ácido sulfúrico concentrado,
conhecido hoje como o processo de contato. Basicamente todo o fornecimento
mundial de ácido sulfurico atual é feito por este método.
Obtenção Industrial
O ácido sulfúrico
pode ser produzido através de dois processos distintos, um a câmara de chumbo e
o outro o processo chamado de contato. O primeiro método apresenta certa
desvantagem em relação ao outro, pois ele resulta em uma concentração final de
no máximo 78% em massa, sendo por tal circunstância que esse método veio a cair
em desuso no século passado. Analogamente podemos comparar o processo de
contato a uma receita, na qual se segue basicamente as três etapas seguintes:
Purificação e combustão do enxofre;
Conversão catalítica do dióxido de
enxofre em trióxido de enxofre;
Absorção do trióxido de enxofre;
Para obter-se o
dióxido de enxofre, pode-se consegui-lo através de enxofre, sulfetos, sendo o
de ferro o principal, conhecido por pirita, de sulfatos e de resíduos de
tratamentos aos quais foi utilizado ácido sulfúrico. Os fatores que levam a
escolha da matéria-prima são diversos, onde encontramos a disponibilidade,
aproveitamento de subprodutos e os gastos com secagem e limpeza do gás.
Ressalta-se que sempre a uma preferência pelo enxofre e pela pirita, pois se
deixam os outros para situações as quais necessitem de valores reduzidos de
gastos.
No processo de purificação
do enxofre, são realizados inicialmente os processos de fusão, sedimentação e
filtração do enxofre, com a finalidade de remover as impurezas presentes no
material. As impurezas presentes no enxofre são geralmente óleos, gases,
arsênio, selênio e telúrio, o arsênio apresenta-se na forma de sulfetos,
enquanto que o selênio e o telúrio apresentam-se no estado elementar. Tendo em
vista que a remoção destas impurezas é um processo muito complicado, envolvendo
inclusive a destilação do ácido sulfúrico, a eliminação destes contaminantes
não é normalmente efetuada.
Quanto à
contaminação por umidade, ácidos e materiais sólidos são mais facilmente
removíveis. Os materiais sólidos geralmente formam cinzas, que quando
acumuladas provocam danos nos catalisadores e nos tubos de filtragem, sendo
assim existem dois processos clássicos para a retirada desse material, que
seriam a sedimentação e a filtração.
Atualmente, a
maioria das instalações de produção de ácido sulfúrico adota o sistema de
filtração combinado com o de sedimentação, o que permite atingir um grau de
remoção de cinzas, a níveis de 20 a 50 ppm que propicia longos períodos de
operação do conversor em condições favoráveis de eficiência.
Para obtenção do
dióxido de enxofre, faz-se a combustão do enxofre com oxigênio ou ao ar seco
previamente com ácido sulfúrico. Para utilizar-se do oxigênio são necessários
materiais especiais, resistentes a alta temperatura liberada na combustão.
Contudo a vantagem desse método é a menor dimensão dos equipamentos somados a
uma diminuição de substancias gasosas poluentes, demonstrando assim uma maior
eficácia no processo. Conforme dito, representa-se a formação do dióxido de
enxofre do seguinte modo:
Esta reação ocorre
em uma câmara, na qual o enxofre é vaporizado através do próprio calor da
combustão. Na fase gasosa, o enxofre reage com o ar, elevando a temperatura do
meio próximo a 1000 °C. A massa gasosa resultante na câmara é resfriada e
adicionada a um meio catalítico, para oxidação do dióxido de enxofre a trióxido
de enxofre, sendo representado pela equação a seguir:
Ao final do
processo, que é a absorção do dióxido de enxofre, ocorre quando a massa gasosa
vinda do conversor catalítico é borbulhada em torres recheadas, em
contracorrente com ácido sulfúrico. A água de diluição contida no agente
absorvente reage com o trióxido de enxofre formando o ácido sulfúrico, sendo
representado esquematicamente a seguir:
Produção Mundial
O ácido sulfúrico é
um dos compostos químicos de maior importância industrial. No ano de 2001 foi o
composto com maior produção nos Estados Unidos, chegando à produção anual de
29.050.000 toneladas. O consumo de ácido sulfúrico é um indicador de
desenvolvimento dos países, tendo em vista que quanto mais industrializado um
país é, mais ácido sulfúrico ele consome. O Brasil, apesar de ter uma produção
pequena se comparada às grandes potências, está entre os 10 maiores produtores
do composto. Segue abaixo uma tabela com os valores de produção mundial.
Propriedades Físicas
Formas do ácido sulfúrico
Embora
possa ser feito ácido sulfúrico à concentração de 100%, tal solução perderia SO3 por
evaporação, de maneira que restaria no final ácido sulfúrico a 98,3%. A solução
a 98% é mais estável para a armazenagem e por isso é a forma usual do ácido
sulfúrico "concentrado". Outras concentrações do ácido sulfúrico são
usadas para diferentes fins:
· 33,5% : baterias ácidas (usado em
baterias de chumbo-ácido)
· 62,18%: ácido de câmara ou ácido
fertilizante
· 77,67%: ácido de torre ou ácido de
Glover
· 98% : concentrado (altamente
desidratante)
O ácido
sulfúrico também existe em diferentes purezas. O H2SO4 técnico
é impuro e frequentemente colorido, mas é apropriado para a fabricação de
fertilizante. O ácido sulfúrico de grau farmacêutico é usado para produzir
fármacos e pigmentos.
Quando
concentrações altas de SO3 (g) são adicionadas ao ácido
sulfúrico, há formação de H2S2O7. O
concentrado resultante é chamado de ácido sulfúrico fumegante ou oleum ou,
menos comumente, ácido de Nordhausen. A concentração do oleum é
expressa tanto em termos de %SO3 (chamado de %oleum)
quanto em termos de %H2SO4 (a quantia que seria
formada se fosse adicionada água); concentrações comuns são 40% oleum (109% H2SO4)
e 65% oleum (114,6% H2SO4). O H2S2O7 puro
é de fato um sólido com ponto de fusão de 36 °C.
Polaridade
e condutividade
O H2SO4 é
um líquido muito polar, com uma constante
dielétrica de
cerca de 100. Isto é pelo fato de o ácido sulfúrico ser capaz de dissociar-se e
protonar a si próprio, em um processo conhecido como autoprotólise, que
acontece a um grau 10 bilhões de vezes maior que na água:
Este fato
permite que prótons sejam altamente móveis em H2SO4 e
faz do ácido um excelente solvente para muitas reações químicas.
Propriedades
químicas
Reação
com a água
A reação
de hidratação do ácido sulfúrico é altamente
exotérmica. Se a água for vertida sobre o ácido sulfúrico concentrado, poderá
ferver e espirrar de forma perigosa. Sempre deve-se adicionar o ácido
sobre a água e não o contrário. A reação consiste em formação de íons
hidrônio, da seguinte forma:
E ainda:
Como a
hidratação do ácido sulfúrico é termodinamicamente favorável (ΔH = -880
kJ/mol), este ácido é um excelente agente desidratante. É usado para preparar
diversas frutas secas. A afinidade do ácido sulfúrico por água é tanta que o
ácido tomará átomos de hidrogênio e oxigênio de outros compostos; por exemplo, a
mistura de amido (C6H12O6)n e
ácido sulfúrico forma carbono elementar e água, que é absorvida
pelo ácido:
Pode-se
ver tal reação acontecer quando uma gota de ácido sulfúrico atinge uma folha de
papel: no lugar onde a gota caiu, o papel fica com uma aparência de queimado.
Produção industrial
O ácido sulfúrico é produzido a
partir de enxofre, oxigênio e água via processo de contato.
Na primeira etapa, o enxofre é
queimado ao ar, produzindo dióxido de enxofre.
O dióxido de enxofre, por sua vez,
é oxidado a trióxido de enxofre com o uso de oxigênio e na presença de um catalisador
de pentóxido de
vanádio:
Finalmente, o trióxido de enxofre
é lavado com água ou uma solução de ácido sulfúrico, com a formação de uma
solução de ácido sulfúrico 98-99%:
Observe
que a dissolução direta de SO3 em água é impraticável por causa
da natureza altamente exotérmica da reação. Forma-se uma névoa ao invés de um
líquido. Alternativamente, o SO3 é absorvido em H2SO4 para
formar oleum (H2S2O7), que é
então diluído, com a formação de ácido sulfúrico.
O oleum reage com
água para formar H2SO4 concentrado.
Recentemente,
a partir dos gases ácidos, como o sulfeto de
hidrogênio,
presente no gás natural, nos gases derivados de petróleo e de gás de síntese, desenvolveu-se o processo
de ácido sulfúrico a úmido.
Usos do
Acido Sulfurico
O ácido sulfúrico é uma commodity muito
importante. Na verdade, a produção de ácido sulfúrico de uma nação é um bom
indicador da sua força industrial. O principal uso (60% do total mundial) do
ácido sulfúrico é na produção de ácido
fosfórico por via úmida que, por sua vez, é usado na produção de fertilizantes fosfatados
e de trifosfato
de sódio, usado em detergentes. A matéria-prima usada para a fabricação de
ácido fosfórico na equação a seguir é a fluorapatita, embora a
composição exata possa variar. O mineral é tratado com ácido sulfúrico a 93%
com a formação de sulfato
de cálcio, fluoreto
de hidrogênio (HF) e ácido fosfórico. O HF é removido na forma de ácido
fluorossilícico. O processo global pode ser representado como:
Os fertilizantes sulfatados, com por exemplo sulfato
de amônio, são feitos com o uso de ácido sulfúrico, embora em menores
quantidades do que os fosfatados.
Outro uso importante do ácido sulfúrico é na fabricação de sulfato
de alumínio. Este sal reage com pequenas quantias de sabão em fibras de polpa
de papel de forma a darcarboxilatos gelatinosos
de alumínio, que ajudam na coagulação das
fibras para formar o papel propriamente dito. O sal de alumínio também é usado
para fazer hidróxido
de alumínio, que é usado em plantas de tratamento de água para filtrar
impurezas e melhorar o sabor da água. O sulfato de alumínio é feito pela reação
da bauxita com
ácido sulfúrico:
O ácido sulfúrico é ainda usado para diversos outros fins na
indústria química. Por exemplo, é o catalisador ácido comum na conversão
de ciclohexanona oxima em caprolactama, que é
usada para fazer Nylon; é usado com sal para
a fabricação de ácido
clorídrico; no refino de petróleo, é
um catalisador da
reação do isobutano com isobutileno, que
dá iso-octano (2,2,4-trimetilpentano), um
composto que aumenta a octanagem da
gasolina; é usado para a fabricação de vários pigmentos.
As baterias de chumbo-ácido presente em automóveis são
recarregáveis e também contêm ácido sulfúrico como eletrólito. A bateria
deste tipo é composta de células com placas de chumbo-ácido. Cada célula produz
2 volts, e uma bateria com 6 células produz 12 volts. O ácido sulfúrico também
é o principal ingrediente de alguns tipos de substâncias desentupidoras de pia
especializadas em desbloquear entupimentos com papel, pedaços de tecido e
outros materiais não facilmente dissolvidos por soluções cáusticas.
Bibliografia
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MATEUS, Edegar; Curso de Química: química geral, Ed. Ática, São Paulo/SP –
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