RUI KNOPFLI

 (1932–1997), viveu em Moçambique até 1975, um dos nomes mais importantes da vida cultural moçambicana. Consciente do labor poético, nunca cedeu a imediatismos portadores de ideologias, mantendo a sua independência artística, autonomia e, decerto, exclusividade. Autor bipátrida, cuja obra, para além de outros temas, denuncia uma procura sempre aflita de raízes e identidade (a nível pessoal e literário). Hoje em dia recuperado pela voz de novas gerações de poetas. Dentro da sua obra destacam-se as coletâneas O País dos Outros (1959), Mangas Verdes Com Sal (1969), Memória Consentida. 20 Anos de Poesia – 1959/1979 (1979), O Monhé das Cobras (1997).

NATURALIDADE

Europeu, me dizem.

Eivam-me de literatura e doutrina

europeias

e europeu me chamam.

Não sei se o que escrevo tem a raiz de algum

pensamento europeu.

É provável… Não. É certo,

mas africano sou.

Pulsa-me o coração ao ritmo dolente

desta luz e deste quebranto.

Trago no sangue uma amplidão

de coordenadas geogáficas e mar Índico.

Rosas não me dizem nada,

caso-me mais à agrura das micaias

e ao silêncio longo e roxo das tardes

com gritos de aves estranhas.

Chamais-me europeu? Pronto, calo-me.

Mas dentro de mim há savanas de aridez

e planuras sem fim

com longos rios langues e sinuosos,

uma fita de fumo vertical,

um negro e uma viola estalando.

(KNOPFLI, Rui. O país dos outros, 1959, In Obra Poética.

Lisboa: Imprensa Nacional – Casa da Moeda, 2003, p. 59).


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