JOSÉ CRAVEIRINHA
(1922–2003), poeta, jornalista e ativista político, preso pela PIDE (o testemunho poético em Cela 1, 1980). Figura tutelar da poesia moçambicana, com poemas de inspiração neorrealista e negritudinista (Xigubo, 1964, Karingana ua Karingana, 1974), mas também intimista, confessional e amorosa (Maria, 1988). A sua obra na totalidade, que exprime uma busca incessante da moçambicanidade, pode ser percebida como uma “epopeia” da nação.
GRITO NEGRO
Eu sou carvão!
E tu arrancas-me brutalmente do chão
E fazes-me tua mina
Patrão!
Eu sou carvão!
E tu acendes-me, patrão
Para te servir eternamente como força motriz
mas eternamente não
Patrão
Eu sou carvão!
E tenho que arder, sim
E queimar tudo com a força da minha combustão.
Eu sou carvão!
Tenho que arder na exploração
Arder até às cinzas da maldição
Arder vivo como alcatrão, meu irmão
Até não ser mais tua mina
Patrão!
(CRAVEIRINHA, José. Xigubo. Lisboa: Edições 70, 1980, p. 13)