Comércio de Marfim
No final do séc. XV há uma penetração mercantil portuguesa,
principalmente pela demanda de ouro destinado à aquisição das especiarias
asiáticas.
Inicialmente, os Portugueses fixaram-se no
litoral onde construíram as fortalezas de Sofala (1505), Ilha de Moçambique
(1507). Só mais tarde através de processos de conquistas militares apoiadas
pelas actividades missionárias e de comerciantes, penetraram para o interior
onde estabelecerem algumas feitorias como a de Sena (1530), Quelimane (1544).
O propósito, já não era o simples controlo do
escoamento do ouro, mas sim de dominar o acesso às zonas produtoras do ouro.
Esta fase da penetração mercantil é designada de fase de ouro. As outras duas
últimas por fase de marfim e de escravos na medida em que os produtos mais
procurados pelo mercantilismo eram exactamente o marfim e os escravos
respectivamente.
Com o declínio da fase do ouro em 1693, deu
lugar ao comércio do marfim. A produção e a comercialização do ouro diminuíram
em detrimento do marfim passando a ser o produto mais procurado pelos
mercadores.
A insurreição de 1693, levou muitos portugueses
refugiarem-se em Tete, Sena e Quelimane, e mais tarde no Norte de Zambeze,
região ocupada pelo estado marave. Aqui foram aberto campos de mineração
denominados de Bares, mas a quantidade do ouro explorado era ínfima.
Nos territórios situados entre-os-rios Lungua e
Quelimane fazia-se bastante o comércio de marfim e a sua produção bem como a
sua comercialização estava organizado em regime de monopólio das classes
dominantes Phiri, especialmente pelo Phiri Caronga e Lundu.
A semelhança do ouro no mwenemutapa, o marfim
nos maraves constituía a fonte principal de produção e do poder politico, por
isso, eram frequentes os conflitos inter-dinásticos para a obtenção dos bens de
prestígio (tecidos e missangas) garantes da lealdade politica.
Estes factores produziram um movimento armado
para leste, os Lundu, iniciaram um processo de expansão e conquista designado
de expansão Nhanja ou Zimba, que culminou com o controlo temporário das
principais rotas do marfim da costa norte. Atingiram Angoxe, passando por
Makuana (Utuculu) e Cambira no terceiro quartel do século XVI, e foi aberta uma
rota comercia a favor dos Lundu.
Em 1622, os Kuronga aliaram-se aos Portugueses
e derotaram os Lundu, passando a controlar arota dos Lundu (Chire-Mussoril). Os
Portugueses passaram a ser mais aceites no Norte do Zambeze.
O grande Estado do (Macanga) Kaetano de
Pereira, nascido no século XVIII resultado da política de casamentos feitos com
filhas do chefe do estado Undi, foi uma das consequências da penetração
mercantil e militar portuguesa.
Pode se afirmar que, o papel do capital
mercantil e militar português no estado marave, concorreu numa primeira fase
para o reforço do poder económico dos chefes e na segunda fase foi responsável
pela instabilidade politico-militar e económico do estado. Por outro lado a
actuação do capital mercantil destinava-se a apoiar as duas fontes de
rendimento: os direitos aduaneiros em grande escala, vindos da Ilha da
Moçambique e em pequena escala, de Quelimane e o comércio.
Factores
que concorreram para a decadência:
·
Conflitos no seio das classes
dominantes Mareve (lutas enter-phiri) qui visavam assegurar o controlo do
comércio do marfim;
·
O bloqueio das rotas comerciais no
estado feito pelos Ajaus, assim como pelos prazeiros;
·
A penetração mercantil no fim do
século XVIII na esfera política do estados
·
A invasão Nguni na primeira metade
do século XIX (1835) dirigidos por Zwangedaba Jege.
As
redes comerciais de Moçambique
Apesar de, e com bastante frequência, os documentos nos
apresentarem os Indianos na qualidade de rivais dos moradores, ambos os grupos
se integravam numa complexa rede de trocas e relações comerciais, rede esta que
se estendia bem para o interior do território. O comércio do marfim criara todo
um sistema de relações sociais e de comunidades cujas fortunas dependiam umas
das outras. Uma das pontas desta rede era formada pêlos grupos de caçadores de
elefantes que, no interior de África, perseguiam as manadas, isolavam os
adultos com presas, matando-os utilizando métodos que tanto tinham de perigoso
quanto de sofisticado. Embora os elefantes pudessem ser caçados pêlos homens de
uma determinada aldeia que decidiam ocupar parte do seu tempo dedicando-se a
esta actividade lucrativa, tratando também deste modo de conseguir um pouco de
carne para as respectivas famílias, vamos encontrar uma série de caçadores de
elefantes profissionais, alguns dos quais a trabalhar directamente sob as ordens
dos chefes, dos mercadores, mesmo dos detentores de prazos.
Independentemente dos meios utilizados para matar os animais,
o chefe territorial da área onde decorria a caçada reclamava uma presa para si
- a presa principal - a qual funcionava como uma espécie de tributo. Foi deste
modo que os chefes se transformaram em parceiros de peso no que respeitava ao
comércio do marfim, papel este que não paravam de enfatizar, já que tudo faziam
na tentativa de controlar as feiras onde o marfim era vendido aos chefes das
caravanas. A menos que habitassem numa zona situada a apenas alguns dias de
marcha da costa, só muito raramente o marfim era para aí levado por aqueles que
o haviam caçado. Assim, eram os chefes das caravanas que iam buscar o material
ao interior. No século xvm, e na região do Zambeze, eram os Yao que dominavam
as caravanas. Os chefes Yao não paravam de alargar o seu campo de acção, e, a
pouco e pouco, acabaram por dominar todas as rotas que se estendiam através do
velho império marave desde o mar até ao Luangwa, a ocidente. Em meados do
século XVIII, os Yao continuaram a alargar a sua zona de influência comercial,
não só rumo às terras situadas a ocidente do Luangwa, como também em direcção
àquelas situadas a sul do Zambeze.
As caravanas Yao, por vezes constituídas por mais de mil
indivíduos, transportavam o marfim até à costa depois de negociarem a sua
passagem através dos territórios dos chefes macuas, os quais, e graças a isto,
acabavam por participar nos lucros obtidos com o comércio. À medida que se aproximavam
da zona da costa, os Yao penetravam então numa zona onde a rede comercial
relativa ao marfim se tornava densa e complexa. Quando ainda lhes faltava
percorrer uma boa parte do percurso, eis que lhes surgiam os agentes dos
moradores portugueses, mais conhecidos por patamares, os quais estavam
autorizados a comprar marfim. Contudo, as rivalidades entre estes patamares
eram enormes, o que por vezes os levava a empreender acções violentas contra as
plantações e aldeias portuguesas situadas junto à costa. Convém recordar a
existência de um sem-número de compradores ilegais de marfim, que operavam por
conta dos xeques suaflis, também eles instalados nas regiões costeiras.
Contrabandeavam o marfim a partir de uma série de pequenos portos, tentando
deste modo evitar o pagamento das taxas exigidas pela casa aduaneira instalada
na Ilha de Moçambique. Por seu turno, os patamares encontravam-se ligados aos moradores,
ou, e com uma frequência cada vez maior, às casas comerciais indianas que lhes
forneciam uma série de artigos destinados ao comércio em troca do marfim por
eles conseguido. Escusado será dizer que, entre estas casas comerciais, os
laços de deve e de haver, a cooperação mútua, e, claro está, as rivalidades
habituais, constituíam uma constante.
O
comércio de marfim no Estado de Angoche
A cerca de cem milhas a sul de Sancul, a meio caminho do
delta do Zambeze, encontrava-se a antiga cidade de Angoche. No início do século
xvi, e devido à política conduzida pelo seu chefe, que tudo fizera para atrair
os mercadores muçulmanos interessados nos lucros conseguidos com o comércio do
ouro proveniente do Zambeze, ao mesmo tempo que evitara cair nas mãos do
monopólio português estabelecido em Sofala, a cidade gozara de uma prosperidade
notável. Contudo, em meados do século, Quelimane desenvolvera-se como o
principal porto de acesso ao interior, diminuindo Angoche consideravelmente de
importância, embora participasse de um modo algo modesto no comércio do marfim.
Os Portugueses mantinham aí um feitor, tendo este começado por comprar marfim
em nome da Coroa, depois do que o passara a fazer para o capitão de Moçambique.
São poucas as menções feitas a Angoche na literatura do século xvn, e, no
século seguinte, sabemos que a feitoria portuguesa acabara por ser encerrada.
Deste modo, e durante um período de quarenta anos, nenhum navio português
dedicado ao comércio aí parou, pelo menos a título oficial.
No entanto, existiam uma série de laços que ligavam os
sultões de Angoche aos portugueses instalados na Ilha de Moçambique. Os sultões
receberam dos Portugueses o título de capitão-mor, e, enquanto parte desta
relação especial, não pagavam quaisquer taxas alfandegárias relativas aos
navios por eles enviados para a ilha. No século xviu, os artigos exportados a
partir de Angoche paraallha de Moçambique consistiam quase que exclusivamente
em produtos alimentares e nos elaboradíssimos tapetes que, desde o século XVI,
haviam tornado a cidade famosa. Porém, é igualmente certo que canoas
provenientes de Angoche visitavam certos assentamentos costeiros situados
a sul, onde se dedicavam ao comércio do âmbar e do marfim.
Francisco Moraes Pereira, um juiz português que visitou
Angoche em 1752, deixou-nos uma descrição muito agradável deste entreposto
independente da cultura islâmica. Por esta altura, e devido a uma série de
disputas com os macuas que habitavam a zona continental, a cidade velha fora
abandonada, encontrando-se agora Angoche edificada num outro local.
Conclusão
Terminado
o trabalho pôde concluir-se que durante vários séculos o ouro foi o produto
mais importante no comércio com os Portugueses, mas quando começou a rarear ou
quando não o havia em determinada região, os Portugueses voltaram-se para o
marfim. Com o fim do
ciclo do ouro e a expulsão dos portugueses das terras do Mwenemutapa, o
comércio de marfim ganhou maior expressão com a participação dos portugueses
nesta nova actividade mercantil. Contudo, deu origem a conflitos entre os
vários Estados Marave. A norte do Zambeze, nos territórios situados entre o rio
Luangua e Quelimane, a produção de marfim crescia muito. A sua comercialização
baseava-se, sobretudo, na troca de tecidos e missangas por marfim.
O comércio do marfim ao longo do rio
Zambeze parece ter sido a base do poder dos chefes Marave, cujo centro se encontrava
localizado junto ao rio Chire.
Vale citar também que o
marfim era um produto exótico e caro que os Portugueses levavam para a Europa a
fim de comerciar. Depois dos ciclos de exploração do ouro e do marfim, os
Portugueses começaram a comercializar escravos.