A Montagem Do Estado Colonial
A montagem do Estado colonial em Moçambique não foi simples nem linear. No Início debateu-se com resistências e depois surgiram problemas de ordem administrativa e económica. António Enes e Aires d¢Ornelas são duas das figuras que mais contribuíram para a montagem deste aparelho de Estado. Contudo, a montagem do Estado colonial não foi alheia à queda da monarquia e ao Início do Estado Novo em Portugal.
A primeira reforma administrativa de Moçambique veio de
António Enes enviado como comissario para Moçambique. A sua tarefa era tornar
efectiva a ocupação portuguesa e a autoridade em todo o espaço territorial de
Moçambique. Enes defendia a necessidade de mudanças no sistema de administração
colonial no território, apoiando-se na proposta de descentralização.
“É em Moçambique que
Moçambique deve ser governado.” António Enes
Descentralização
leis do trabalho forçado e do regime de trabalho contratado
Para Enes os concelhos deviam ser substituídos por
circunscrições civis ou comandos militares, mas apenas nas zonas onde ainda se
registavam fosos de resistência.
Havia uma necessidade crescente de encontrar uma forma de tirar
o maior proveito possível dos recursos existentes na colónia.
Para isso, foi necessário que as autoridades portuguesas
locais tivessem amplos poderes para impor a autoridade e a lei aos nativos,
isto é, estabelecer administração efectiva. E ainda criar mecanismos para o
aproveitamento dos ciganismos políticos tradicionais local, para impor a força
do chefe local africano e a obrigação geral do pagamento de impostos, criando
leis do trabalho forçado e do regime de trabalho contratado. A Lei do Trabalho
concebida por António Enes foi o primeiro passo para a unificação
administrativa colonial.
Foi no final do século XIX, no âmbito das chamadas campanhas de
pacificação, que se definiram duas figuras fundamentais na montagem do aparelho
de Estado colonial. Foram instituídos os comissários régios e as companhias
majestáticas, ambos detentores de amplos poderes.
A reorganização
administrativa de 1907
A reorganização administrativa de 1907 de Aires d’Ornelas, um
dos grandes obreiros da administração colonial em Moçambique, apresentou novas
propostas que sugeriam, entre Outras coisas, ampliação dos poderes do
governador embora com alguns limites.
E deliberou um novo dispositivo legal com uma nova estrutura administrativa.
A nova estrutura
administrativa promovida por Aires d’Ornelas |
|
Província
divide-se em cinco distritos: |
Lourenço Marques,
Inhambane, Quelimane, Tete e Moçambique; com sistema de
administração das populações indígenas |
Concelhos |
Divididos em freguesias,
nas zonas pacíficas; Distritos
militares, nas zonas com resistência |
As circunscrições eram dirigidas por um administrador
colonial português. Estas formas de administração constituíam as unidades administrativas
rurais fundamentais e impostas em áreas habitadas por populações africanas.
Estas áreas eram divididas em postos, sob controlo de um
chefe de posto português, o funcionário administrativo mais próximo da população
rural. Este chefe de posto controlava através de chefes africanos, os régulos.
O régulo tinha funções ambíguas. Por um lado, estava do lado e a proteger o seu
povo, mas por outro tinha de prestar contas à metrópole.
As funções dos régulos eram
essencialmente:
Ø Colectar os
impostos;
Ø Controlar o processo
de recrutamento da força de trabalho para as plantações;
Ø Dirigir o trabalho
de chibalo;
Ø Manter as vias de
comunicação;
Ø Julgar os casos de
pequena instância (milandos);
Ø Proteger o seu povo;
Ø Assegurar o controlo
da produção agrícola.
Outros
contributos para a montagem do aparelho de Estado colonial
Todo o sistema administrativo criado tinha bem marcada a
divisão entre negros e brancos. Lourenço Marques ganhou nesta reforma
administrativa o estatuto de capital da província da colónia de Moçambique.
No processo da montagem do Estado colonial, criou-se uma secretaria
para os assuntos nativos que se especializou na inventariação e catalogação da
mão-de-obra para fora e dentro do território de Moçambique.
Foi introduzida a carreira administrativa sistemática pela
qual foram atribuídos amplos poderes aos governadores. No entanto, esses
governadores precisavam de ter um conhecimento dos usos e costumes indígenas e
a prática de serviço no interior dó território.
Isto é, os governadores tinham de conhecer em profundidade Moçambique,
as suas gentes e os seus costumes.
Foi criada em 1902 a Intendência dos Negócios Indígenas e Emigração,
cuja função era a coordenação de todos os assuntos relacionados com os
indígenas. Algumas funções desta intendência:
Ø A inventariação da
mão-de-obra;
Ø Julgar e punir todos
aqueles que fugissem do trabalho;
Ø Fazer a gestão da
força de trabalho;
Ø Administrar a
justiça, etc.
Houve um grande
esforço por parte das autoridades administrativas coloniais de legislar um
conjunto de regulamentos laborais destinados aos negros, naquilo que chamavam
“a obrigação moral e legal dos nativos trabalharem Foram os códigos de trabalho
de 1890, 1899, 1911, 1914 e 1920.
O Estado colonial também organizou metodicamente os seus aparelhos
repressivos na administração, no exército, na polícia, nos tribunais e nas
prisões. A função destes aparelhos repressivos da administração colonial era
garantir, pela violência, a disponibilidade da força de trabalho através de
recenseamentos, impostos, etc.
A
República em Portugal e o Estado Novo e as suas implicações no aparelho de
Estado colonial
Com o fim da monarquia Constitucional em Portugal, em 1910,
foi implantado o regime republicano. A nova portuguesa de 1911 recomendou a
descentralização para as Províncias ultramarinas e o estabelecimento de leis
especiais que servissem ao Estado de civilização de cada uma delas.
Com a chegada ao poder do Estado Novo, a política de montagem
do aparelho de Estado colonial mudou completamente. Com o Acto Colonial (1930),
o Estado Novo centralizou o poder, acabou com o Conceito de autonomia provincial
e com toda a legislação promulgada até então. No fundo, o Acto Colonial
traduziu-se numa centralização do poder concentrada no ministro das Colónias,
em detrimento da acção da Assembleia Nacional e dos governos coloniais.
A
transformação de moçambique em um estado colonial
A transformação de Moçambique numa colonia de produção de
matéria-prima para a metrópole foi acompanhada de dois pressupostos mutuamente
condicionados:
Ø As colonias deviam
produzir matérias-primas e, por consequência, as mesmas deviam disponibilizar a
mão-de-obra para tal produção.
Ø Os produtores dessas
matérias-primas pertenciam a raças inferiores e, como membros de raças
inferiores, deviam trabalhar para as raças superiores.
A partir de 1891,
quando António Enes e nomeado comissário-régio de Moçambique, dá-se origem a
Escola do Estado Colonial. Enes defendia a necessidade de mudanças no sistema
de administração, insistindo para a descentralização administrativa na
governação das colonias.
Dizia ele: "é em Moçambique que Moçambique deve ser
governado".
Assim, em 1895, Enes criou a circunscrição indígena
(implementada pela primeira vez em Lourenço Marques), nesta unidade
administrativa, o colonizador substituía o poder político dos chefes
tradicionais. O colonizador exercia cumulativamente, as funções de
administrador e juiz.
Os indígenas eram divididos em circunscrições e estas por sua
vez em regedorias. Para os colonos nasceram novas unidades administrativas: os
conselhos divididos por sua vez em freguesias.
Em 1907, durante o governo de Freire de André foi publicado a
reforma administrativa de Moçambique, introduziu também a carreira
administrativa sistemática.
Aos administradores, a entidade atribuiu-lhes amplos poderes
para governar as populações indígenas e passou a ser-lhes exigido o
conhecimento dos usos e costumes indígenas e a prática de serviços no interior.
Como gestor da força de trabalho e juiz do bom comportamento dessa força de
trabalho, o administrador colonial tornou-se antropólogo de carreira, o
pesquisador da organização social dos nativos. Pois, partia-se do pressuposto
de que, quanto mais conhecida fosse a organização social, mais eficiente seria
o controlo judiciário e o permanente fornecimento da mão-de-obra.
Em 1910, dá-se em Portugal a queda da Monarquia liberal e
proclama-se a Republica, a nova constituição de 1911, recomendou a
descentralização das províncias Ultramarinas. Essa mudança tinha em vista
justificar o tratamento especial que devia ser dispensada às populações das
colonias e devido o pressões internacionais. Foi igualmente considerada a
autonomia financeira das colonias, com uma fiscalização da metrópole.
Para este período, o Estado colonial não só legislou sobre a
obrigação moral e legal dos nativos trabalharem, também organizou metodicamente
os seus aparelhos repressivos: administração, exercito, sipaios, tribunais,
prisões. A função desses aparelhos era a de garantir, pela violência a
disponibilidade da força de trabalho, disponibilidade que se conhecia pelos
recenseamentos, pelos impostos, pelos índices demográficos, pelos cartões de
trabalho.
Em suma: o estado colonial português em Moçambique foi
montado para servir os diversos interesses do capital internacional. Toda a legislação
publicada entre 1886-1930, destinava-se a manter e a reproduzir a força de
trabalho indígena. Por isso, o Estado usou mais os aparelhos repressivos e
menos os aparelhos ideológicos.
Conclusão
Terminado trabalho,
pôde concluir-se de uma forma resumida que o sipaio era para reprimir a
população, ajudando os administradores e os régulos. Os régulos cobravam uma
taxa aos mineiros e recebiam uma quantia por cada problema que resolviam.
Para o funcionamento
da economia colonial estava baseada nas plantações cujas culturas estavam
viradas para o mercado externo, algodão, cana-de-açúcar, coqueiro, borracha e
outros. Para plantar, sachar, cortar, extrair, transportar para as fábricas e
processamento industrial, carregamento de navios era utilizada a força braçal,
pois não havia máquinas. Constatou-se também que o colono fazia recenseamento
distribuindo cadernetas para controlar o pagamento de impostos e trabalho
forçado.
A mão-de-obra era
importada para África do Sul e Rodésia do Sul. A mão-de-obra barata era também
utilizada na carpintaria, serralharia, metalurgia, construções públicas,
oficinas de reparação de barcos e tinham como dirigentes os estrangeiros.