Historiografia na Segunda Metade do Século XIX
O Positivismo
O positivismo surgiu em reacção ao Romantismo graças à contribuição de Auguste Comte que, na tentativa de explicar a evolução intelectual da humanidade, formulou a sua teoria com base na lei dos três estados.
O que é que dizia a Lei dos três estados de A. Comte? Leia o texto a seguir
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Partindo da lei dos três estados e, sobretudo, reconhecendo no estado positivo do espírito humano a era do desenvolvimento industrial e científico, Auguste Comte defende que a evolução da sociedade rege-se pelas mesmas leis da evolução da natureza e por isso as ciências humanas deviam seguir os mesmos métodos das ciências exactas.
Ao estudar deste modo o desenvolvimento total da inteligência humana, (...), julgo ter descoberto uma grande lei fundamental (...). Esta lei consiste em que cada uma das nossas principais concepções, cada ramo dos nossos conhecimentos, passa sucessivamente por três estados teóricos diferentes: o estado teológico ou fictício; o estado metafísico ou abstracto; o estado científico ou positivo. No Estado teológico, o espírito humano, (…), imagina que os fenómenos são produzidos pela acção directa e contínua de agentes sobrenaturais mais ou menos numerosos, cuja intervenção arbitrária explica todas as aparentes anomalias do universo. No Estado Metafísico que, no fundo, não é mais do que uma simples modificação geral do primeiro, os agentes sobrenaturais são substituídos por formas abstractas, verdadeiras entidades (abstracções personificadas) inerentes aos diversos seres do mundo e concebidas como capazes de engendrar por si próprias todos os fenómenos observados, cuja explicação consiste então em atribuir a cada um a correspondente entidade. Enfim, no Estado Positivo, tendo o espírito humano reconhecido a impossibilidade de obter noções absolutas, renuncia a procurar a origem e o destino do universo e a conhecer as causas íntimas dos fenómenos, para unicamente se ater e descobrir, pelo uso bem combinado do raciocínio e da observação, as suas leis efectivas, isto é, as suas relações invariáveis de sucessão e de semelhança.
Para os positivistas, as ciências naturais consistiam de dois procedimentos básicos: A determinação dos factos - através da percepção sensorial (ver, sentir, ouvir...) e; Estabelecimento de leis - através da generalização feita a partir desses factos por indução. Partindo desta percepção de ciência surgiu a chamada historiografia positivista cujas principais características eram:
Defesa de uma crítica exigente às fontes, tal como acontece nas ciências exactas;
Rejeição do papel interpretativo do historiador. É a defesa da objectividade absoluta.
O importante para o historiador é descrever os factos tal como aconteceram. Não deve emitir qualquer juízo pois "os factos falam por si";
A limitação da noção de documento histórico ao documento escrito. Em história a opção pelos métodos das ciências exactas faz com que só as fontes escritas se prestem ao trabalho do historiador positivista;
O bjectivo do historiador é obter do passado uma imagem o mais fiel possível da realidade e não propriamente conhecer o passado;
Não é tarefa do historiador interpretar esses factos. Como dizem “os factos falam por si”. A história universal foi vista como um sonho vão e a literatura histórica típica passou a ser a monografia. Assim, a história teria a tarefa de descobrir os factos, enquanto a sociologia descobriria as conexões causais entre estes factos.
A sociologia seria, assim, uma espécie de super-história, elevando à categoria de ciência, ao pensar cientificamente sobre os factos a cerca dos quais a história pensava apenas empiricamente.
Os Historiadores Positivistas Ernest Renan - usando as bases historiográficas dos positivistas tenta explicar racionalmente os milagres descritos na Bíblia. Hipolite Taine - teve o mérito de reservar, nos seus escritos, um lugar de destaque aos factos económicos. Sua obra é ensombrada pela sua parcialidade política e pelo uso de fontes suspeitas.
Fustel de Coulanges - defende o estudo minucioso e imparcial dos documentos escritos porque, segundo diz, "a história não é uma arte, é ciência pura" embora seja pouco rigoroso na investigação da credibilidade e proveniência dos mesmos.
O Historicismo Para começar leia o seguinte extracto para ter uma ideia do que é História para os historicistas.
Leitura
A História não é um mundo de acontecimentos objectivos que o historiador exuma do passado, transformando-o em objecto dum conhecimento presente. É o mundo de ideias do historiador. Além de contemporâneo do positivismo, o historicismo até herdou as ideias positivistas, porém distancia-se daquele ao defender que as ciências exactas, que formulam leis gerais e abstractas, são diferentes da ciência histórica que descreve factos individuais, particulares e únicos e que, por isso opõe-se à generalização da lei. Para os historicistas não basta o estabelecimento de relações causais entre os factos históricos, é preciso compreender os factos históricos, como dizem "os factos devem vibrar na mente do historiador".
Como principais representantes do historicismo podem se mencionar os nomes de Dilthey, Benedetto Croce e Collingwood, para quem “não basta o estabelecimento rigoroso das relações causais entre os factos históricos (...). Mais do que descrever, era preciso intuir, compreender os factos históricos”. O Materialismo Histórico O Materialismo Histórico surgiu em meados do século XIX, numa época em que a Europa enfrentava uma nova realidade marcada pela difusão da Revolução Industrial e do Capitalismo, pelo triunfo dos movimentos nacionalistas, pela afirmação dos ideais autonomistas dos povos pelo sindicalismo. Ao tentar explicar a realidade em que se vivia, Marx e Engels tomaram como base a Filosofia de Hegel e formularam uma nova teoria – o Marxismo. Criticando a ideia de Hegel segundo a qual o processo histórico é uma transformação-mudança – Dialéctica – das vontades humanas que se exprimem pela acção, Marx defendeu que também as formas de vida, que exprimem as ideias, se transformam modificando estas.
Considera ainda que é à realidade exterior que cabe papel fundamental (transformador), sendo o espírito apenas espectador. Enfim Marx e Engels atribuem à realidade material, particularmente à realidade económica o papel motor da História. Partindo desta concepção os marxistas desenvolveram uma História Económica, cujas ideias historiográficas podem ser sintetizadas no seguinte:
A História das sociedades humanas revela uma sucessão de modos de produção (esclavagismo, feudalismo, capitalismo);
Em cada modo de produção a estrutura económica sobrepõe-se à superestrutura jurídica, política e ideológica, embora haja acção e reacção de todos esses factores;
A passagem de um modo de produção para outro resulta da oposição, contradição existente na infra-estrutura económica quando a as forças produtivas entram em confronto com as relações de produção; No processo histórico extraem-se leis de evolução que permitem prever o futuro da humanidade.
Não obstante o notável valor das ideias marxistas para a história, tanto a nível metodológico como da concepção da história, esta corrente historiográfica não se impôs senão a partir das décadas 20/30 do século XX.
Com efeito, o Marxismo para além de ser uma corrente de pensamento foi, igualmente, uma doutrina militante anti-capitalista o que a tornou alvo do que se chamou bloqueio anti-marxista. Embora tenham surgido diferentes correntes historiográficas na segunda metade do século XIX, o Positivismo tornou-se a corrente dominante, pelo que a História deste período é, essencialmente, Positivista.
O realce dado pela história aos assuntos institucionais e políticos fez da história a área de conhecimento preferida pelos dirigentes de modo que, mesmo com o surgimento das ciências sociais e humanas, a História continuou a ser "dona" e "senhora" do conhecimento humano. Era como se fosse a "mãe" de todas as ciências. Era, portanto, a ciência privilegiada no conjunto das ciências sociais.