DAWN

Agónica noite estremece

e despedaça-se

lá fora em chuva

nas vidraças.

Das sombras, das solidões

dos recantos recônditos

da noite e da chuva

saem homens.

Pela crosta da terra passa

um frémito de arrepio.

Chove.

Chove em África.

É noite

É noite em África.

Mão desmedida ergue-se

no breu,

corpo da terra que as águas

fecundam, impregnam.

Silêncios, hesitações,

sono de séculos, jugos,

racham em surdina.

Jogamos bridge na tepidez

do living,

reclinamo-nos na morna

penumbra erótica

dos cinemas,

ou dormimos em calma

digestão.

Para lá

da noite angustiada

monótono acalanto ergue

a voz.

No inescrutável, nas sombras,

nos recantos recônditos de agónica noite

África desperta…

(KNOPFLI, Rui. O país dos outros, 1959, In Obra Poética.

Lisboa: Imprensa Nacional – Casa da Moeda, 2003, p. 88–89)

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