O capital comercial no quadro da agricultura forçada: o caso do algodão, arroz e chá


Um estudo histórico do modo da divisão da terra e da orientação da produção mostram-nos o seguinte: antes da invasão portuguesa, as terras em Moçambique, da mesma maneira como as da maior parte da África anterior à invasão branca, nunca foram propriedade privada dos 1mperadores, dos reis ou dos agricultores, dos chefes tribais, embora estes tivessem de pagar um tributo. A terra foi sempre propriedade colectiva do povo, do reino ou tribo e o sistema de repartição do terreno era feito segundo as necessidades do grupo familiar.

Portugal e Capital Multinacional em Moçambique, vol. II, p. 33

O fim da propriedade colectiva em Moçambique.

 

O Acto Colonial e a Carta Orgânica do Império Colonial Português impuseram às colónias o papel de fornecedoras de matéria-prima e manifestou-se ainda a declarada intenção de cultivar certos produtos em detrimento de outros.

Caso do algodão

Moçambique tornou-se um fornecedor de matéria-prima para Portugal, sobretudo de algodão. O algodão era produzido em regime desumano de trabalho forçado, sem qualquer dispêndio do capital em salários. A promoção da cultura de algodão em trabalho forçado permitiu que os industriais portugueses usufruíssem de alguns benefícios, tais como:

— O fornecimento certo de boa e barata matéria-prima;

— O Governo fornecia as sementes à população camponesa e comprava-lhes toda a produção do algodão colhido;

— A penetração do produto final nos mercados coloniais e euro peus com preços competitivos;

— O Governo devia fazer concessões de terras algodoeiras a empresas que assumissem o compromisso de construir uma fábrica de descaroçamento do algodão e um armazém.

 

 

 

Ao serem obrigados a cultivar o algodão, os camponeses tinha pouco tempo para o cultivo de culturas de subsistência. A prazo, camponeses deixaram de ter culturas para se alimentarem a si e suas famílias. A fome instalou-se sobretudo nas zonas onde a cintura daquela planta era mais abundante, como Cabo Delgado, Na pula, Norte da Zambézia, Norte de Manica e Sofala (Chemba).

O processo de cultivo do algodão também não era justo. Geralmente, as sementes era dadas aos camponeses; estes semeavam-nas numa terra alugada ao Estado e colhiam o produto; o produto vendido sempre ao Estado (companhia) a um preço baixo; condições de trabalho eram péssimas e havia fome, pois não reatava tempo para tratar das culturas de subsistência; por ano, tinha ainda de pagar os seus impostos e rendas da terra. Ao serem obrigados a cultivar o algodão, os moçambicanos perderam o uso livre da terra, passaram fome e a estar mais dependentes do capital português para pagar as suas rendas e impostos. Instalou-se um ciclo vicioso vantajoso apenas para o colonizador.

A cultura obrigatória do algodão trouxe consequências graves para as comunidades:

— Fome no seio das comunidades;

— Camponeses que protestavam contra o cultivo do algodão;

— Camponeses que fugiam das zonas de cultivo do algodão para os territórios vizinhos;

— Os camponeses juntavam pedras nos sacos de algodão para aumentar o peso e consequentemente o valor a receber por ele.

Face à resistência dos camponeses, as autoridades reforçaram a vigilância, organizando e controlando o processo de cultivo.

Algodão como sendo a maior evidência

Segundo Chilundo et all (1999, p. 84), “a função de Moçambique como fornecedor de matéria-prima a Portugal foi muito evidente com algodão, o qual produzido em regime desumano de trabalho forçado sem qualquer dispêndio de capital em salário permitiu o desenvolvimento das indústrias portuguesas”. Neste caso o algodão permitiu o desenvolvimento das poucas indústrias de vulto (têxtil) e sua penetração nos mercados coloniais e europeus com preços competitivos.

O caso de algodão uma das indústrias portuguesas era a têxtil. Antes de 1926, Moçambique e Angola produziam cerca de 800 toneladas de algodão contra 17000 toneladas que a indústria necessitava anualmente.

O cultivo de algodão foi responsabilizado aos camponeses num sistema fortemente controlado por agentes de administração colonial e das companhias concessionárias.

Os camponeses viam-se obrigados a cultivar o algodão com seus próprios meios de produção e a vender a colheita a preços fixos à companhia que lhes forneceu as sementes. Este sistema reduzia o tempo do campesinato para o cultivo da sua subsistência.

Em 1938 a crescente procura mundial do algodão, aumentando em consequência ao seu preço. Portugal, para controlar todos os aspectos de produção e comercialização do algodão, cria a JEAC, com sede em Lisboa. Atreves deste organismo, o Governo pretendeu estabelecer um maior controlo sobre as companhias concessionárias em Moçambique. O sistema de produção camponesa mantinha-se e as companhias obrigavam-se a desenvolver mais activamente, a cultura de algodão em concessões mais alagadas. Toda a exportação tinha de ser aprovada pela JEAC. No início de 1939 a JEAC tentou promover o aumento da cultura de algodão através de propagandas e da persuasão.

Caso do arroz

Com a crise pós-II Guerra Mundial, que ocasionou o descontrolo dos circuitos comerciais mundiais no que diz respeito à importação do arroz do Sudeste Asiático (via Singapura), aumentou a necessidade da produção de arroz para abastecer as necessidades alimentares da população urbana portuguesa.

Assim, o Governo colonial decidiu criar círculos orizícolas, em 1942, com poderes iguais à Junta do Algodão. Os concessionários da junta deviam distribuir as sementes, fertilizantes e sacos, tendo cada homem moçambicano de cultivar um hectare e cada mulher 1/2 hectare. A cultura do arroz baseava-se na pressão exercida pelos administradores, sipaios e capatazes sobre os camponeses. O arroz devia ser vendido pelo camponês apenas ao concessionário a um preço baixo fixado pelo Governo.

Esta situação também criou muita revolta no seio dos camponeses e muitas fugas de camponeses que preferiam emigrar para outras zonas onde não se praticava esta cultura.

A diminuição significativa da navegação comercial e o desenrolar de acontecimentos políticos no sudeste asiático, nomeadamente a expansão do Japão e a queda da Singapura em seu favor, provocaram a interrupção no fornecimento do arroz (Serra, 2000, p.53). Neste contexto o Governo Colonial decidiu criar círculos orizícolas e entregar o fornecimento de sementes aos camponeses africanos e a compra do produto a concessionários europeus num modelo repressivo semelhantes ao de cultura de algodão. Em resposta a esta situação e para promover a auto-suficiência em arroz o governo colonial decidiu introduzir a produção obrigatória do arroz. A cultura de arroz baseava-se na pressão exercida pelos administradores, sipaios e capatazes. Os concessionários deviam distribuir as sementes semelhantes, fertilizantes e sacos, tendo cada homem cultivar um hectare e a cada mulher meio hectare. O arroz devia ser vendido pelo camponês apenas as concessionarias a um preço baixo fixado pelo governo. O concessionário processava e revendia o produto enriquecendo desta forma em todo processo de comercialização. Nesta altura, os camponeses preferiam emigrar para outras zonas onde na se praticava esta cultura, a cozer ou torrar as sementes, bem como outras formas de protesto. 

 

Caso do chá

Apesar da crise mundial provocada pelo crash bolsista de 1929, o consumo de chá não baixou. O chá, a par do algodão e do caju, foi um dos produtos que mais valorizou, sobretudo devido às seguintes razões:

— Na Zambézia, na década de 30, havia condições económicas e administrativas propícias para a plantação de chá;

— Havia muita mão-de-obra disponível;

— Havia ajuda estatal no fornecimento de mão-de-obra;

— Em 1933, firmou-se o Acordo Internacional de Chá (AIC), que limitou a produção dos principais produtores, dos quais Portugal colonial não fazia parte;

— Nesse acordo foi feita ainda a concertação de preços.

Moçambique começou por usar os férteis terrenos da Zambézia na produção de folha de chá e, fruto do AIC de 1933, conseguiu impor-se num mercado tão exigente.

 

Conclusão

Fim do trabalho pudemos concluir que a produção do arroz tinha como objectivo fundamental abastecer as necessidades alimentares das populações urbanas e surgiu no contexto da 2ª Guerra Mundial em que se tornava difícil a importação do arroz do sudeste asiático via Singapura. Em 1929-1939 a produção e a comercialização do arroz em Moçambique diminuiu, tomando-se mais barato importar arroz a granel do sudeste asiático. Esta importação atingiu cerca de 11 mil toneladas em 1939.

Constatamos também que com o rápido avanço do cultivo de algodão e de arroz (1939-1942) provocou uma crise no fornecimento de mão-de-obra para outros sectores da economia colonial de Moçambique, particularmente a norte do Zambeze. Com vista a apreciar a extensão desta crise e o significado das medidas tomadas para a resolver, é necessário examinar a interligação de todas as culturas do ponto de vista do processo de trabalho.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Bibliografia

·         NHAPULO, Telésfero de Jesus, História 12ª classe, Plural Editores, Maputo, 2013

·         UEM, Departamento de História, 1983, História de Moçambique Volume 2: Agressão Imperialista (1886-1930). Cadernos

 

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