LITERATURA MOÇAMBICANA
A Literatura de Moçambique é, geralmente, a literatura escrita em língua portuguesa - vulgarmente misturada com expressões moçambicanas -, por autores moçambicanos. É ainda muito jovem, mas já conta com exímios representantes como José Craveirinha, Paulina Chiziane e Mia Couto, sendo vital na exigente Literatura Lusófona.
A literatura produzida
em Moçambique, como as demais literaturas africanas nos países colonizados por
Portugal, era uma extensão da literatura portuguesa. Sob a forma escrita, a
produção literária sedimenta-se, a partir da década de 1940, por meio de
periódicos publicados por intelectuais e escritores, em geral de contestação ao
colonialismo português, a exemplo do "Brado literário" que circulou
no país entre 1918 e 1974 com textos de Rui Nogar, Marcelino dos Santos, José
Craveirinha, Orlando Mendes e Virgílio Lemos, entre outros. No século XIX, a
imprensa e a literatura estiveram próximas, sendo a primeira uma alternativa
profissional para os escritores que não podiam sobreviver da produção
literária. Em 1975, quando alcançou sua independência política, Moçambique
ainda era distante de um "sistema literário", conceito criado pelo
teórico Antonio Cândido, segundo o qual um sistema literário passa a existir
quando um grupo de escritores escreve para um público que reage
influenciando-os a produzir novas obras, e assim sucessivamente.
BIOGRAFIA
DE ALGUNS ESCRITORES MOÇAMBICANOS
MIA
COUTO
António Emílio Leite
Couto, ou simplesmente Mia Couto, nascido em Moçambique na Província de Beira,
aos 05 de Julho de 1955, é um biólogo e escritor moçambicano. Estudou na cidade
de Sofala em Baira e aos 14 anos já tinha alguns poemas publicados no Jornal
Notícias da Beira, e em 1971 mudou-se para cidade de Maputo. Iniciou os seus
estudos universitários em medicina mas largou no princípio do 3º ano e passou a
exercer a função de joprnalista em 1974. Foi nomeado como director da Agência
de Informação de Moçambique (AIM) e formou ligações de correspondentes entre as
províncias moçambicanas durante o tempo da guerra de libertação. Em 1983,
publicou o seu primeiro livro de poesia, Raiz de Orvalho, que, segundo algumas
interpretações, inclui poemas contra a propaganda marxista militante. Dois anos
depois, demitiu-se da posição de diretor para continuar os estudos universitários
na área de biologia. Além de considerado um dos escritores mais importantes de
Moçambique, é o escritor moçambicano mais traduzido.
Obras
de Mia Couto
Romances
·
Terra Sonâmbula (1ª
ed. da Caminho em 1992; 8ª ed. em 2004; Prémio Nacional de Ficção da Associação
dos Escritores Moçambicanos em 1995; considerado por um juri na Feira
Internacional do Zimbabwe um dos doze melhores livros africanos do século XX)
·
A Varanda do
Frangipani (1ª ed. da Caminho em 1996; 7ª ed. em 2003)
·
Mar Me Quer (1ª ed.
Parque EXPO/NJIRA em 1998, como contribuição para o pavilhão de Moçambique na
Exposição Mundial EXPO '98 em Lisboa; 1ª ed. da Caminho em 2000; 8ª ed. em
2004)
·
Vinte e Zinco (1ª ed.
da Caminho em 1999; 2ª ed. em 2004)
·
O Último Voo do
Flamingo (1ª ed. da Caminho em 2000; 4ª ed. em 2004; Prémio Mário António de
Ficção em 2001)
·
O Gato e o Escuro, com
ilustrações de Danuta Wojciechowska (1ª ed. da Caminho em 2001; 2ª ed. em
2003), com ilustrações de Marilda Castanha (1ª ed. brasileira, da Cia. das
Letrinhas, em 2008)
·
Um Rio Chamado Tempo,
uma Casa Chamada Terra (1ª ed. da Caminho em 2002; 3ª ed. em 2004; rodado em
filme pelo português José Carlos Oliveira)
·
A Chuva Pasmada, com
ilustrações de Danuta Wojciechowska (1ª ed. da Njira em 2004)
·
O Outro Pé da Sereia
(1ª ed. da Caminho em 2006)
·
O beijo da palavrinha,
com ilustrações de Malangatana (1ª ed. da Língua Geral em 2006) Editora
Caminho.
·
Venenos de Deus,
Remédios do Diabo (2008)
·
Jesusalém [no Brasil,
o livro tem como título Antes de nascer o mundo] (2009)
·
Pensageiro frequente
(2010)
·
A Confissão da Leoa
(2012)
·
Mulheres de cinzas
(primeiro volume da trilogia As Areias do Imperador) (2015)
·
A Espada e a Azagaia
(segundo volume da trilogia As Areias do Imperador") (2016)
·
O Bebedor de
Horizontes (terceiro volume da trilogia "As Areias do Imperador")
(2017)
Crónicas
·
Cronicando (1ª ed. em
1988; 1ª ed. da Caminho em 1991; 7ª ed. em 2003; Prémio Nacional de Jornalismo
Areosa Pena, em 1989)
·
O País do Queixa Andar
(2003)
·
Pensatempos. Textos de
Opinião (1ª e 2ª ed. da Caminho em 2005)
·
E se Obama fosse
Africano? e Outras Interinvenções (1ª ed. da Caminho em 2009)
Contos
·
Vozes Anoitecidas (1ª
ed. da Associação dos Escritores Moçambicanos, em 1986; 1ª ed. Caminho, em
1987; 8ª ed. em 2006; Grande Prémio da Ficção Narrativa em 1990, ex aequo)
·
Cada Homem é uma Raça
(1ª ed. da Caminho em 1990; 9ª ed., 2005)
·
Estórias Abensonhadas
(1ª ed. da Caminho, em 1994; 7ª ed. em 2003)
·
Contos do Nascer da
Terra (1ª ed. da Caminho, em 1997; 5ª ed. em 2002)
·
Na Berma de Nenhuma
Estrada (1ª ed. da Caminho em 2001; 3ª ed. em 2003)
·
O Fio das Missangas
(1ª ed. da Caminho em 2004; 4ª ed. em 2004)
Enquadramento
histórico da obra “Terra Sonâmbula”
O romance Terra Sonâmbula é um retrato honesto e
sincero de dois Moçambiques: um, no período colonial e outro no período
pós-colonial. Mia Couto consegue, neste romance, representar, através de suas
maravilhosas personagens, tecidas genuinamente por uma narrativa criativa e
dominada por uma fantasia que é necessária para que seus personagens pudessem
viver diante das atrocidades provindas da guerra. A terra é o elo de construção
e reconstrução de mitos e ritos ancestrais, fazendo com que o atual momento
presente se ajuste às suas raízes. Mia Couto apresenta entre tantos personagens
um elo decisivo no desenrolar dos fatos, envoltos em dois importantes
personagens representantes do "antes" e do "depois" (o
velho e a criança, representados nas figuras de Tuahir e Miudinha), sinalizando
propositalmente sua assertiva escolha, pois são essas classes etárias as que
mais sofre no tempo de guerra, além de serem o início e fim do desenvolvimento
em que passa todo o ser humano.
Terra
Sonâmbula é um retorno ao passado, à evasão
humana, aos sentidos..., pois de que vale a vida sem este ingrediente (o sonho)
tão necessário à nossa formação cultural. O autor nos convida a sonhar, a
adentrar firmemente na terra e senti-la com toda a sua plenitude, e adentrar ao
mar em sua infinita forma de reconstrução e reiniciação. Terra e mar são o elo
da viagem abraçada por Tuahir, pois só através desta passagem pode o homem
permitir que outros homens surjam. A morte tem sentido e significante. Por ela,
novos tempos nascem, por ela novos homens são paridos, por ela buscamos a
contínua fonte da vida.
Mia Couto nos ensina
através deste romance que há sempre esperança, mesmo em meio a tantas guerras,
desilusões e ilusões.
NOÉMIA
DE SOUSA
Carolina Noémia
Abranches de Sousa Soares (Catembe, 1926 — Cascais, 4 de Dezembro de 2002) foi
uma poetisa, tradutora, jornalista e militante política moçambicana. É
considerada a “mãe dos poetas moçambicanos”.
Filha de Clara
Bruheim, de uma família de comerciantes com origens germânicas, moçambicanas e
goesas. Noémia de Sousa estudou no Brasil e começou a publicar no jornal O
Brado Africano.
Na década de 1940
viveu numa casa de madeira e zinco no bairro da Mafalala, em Maputo. Ali
escreveu poemas que se tornariam símbolos nacionalistas africanos como
"Deixa passar o meu povo". Só saiu do bairro por motivos políticos,
em 1949.
Entre 1951 e 1964
viveu em Lisboa, onde trabalhou como tradutora, mas, em consequência da sua
posição política de oposição ao Estado Novo teve de exilar-se em Paris, onde
trabalhou no consulado de Marrocos. Começa nesta altura a adoptar o pseudónimo
de Vera Micaia.
A sua obra está
dispersa por muitos jornais e revistas. Colaborou em publicações como Mensagem
(CEI), Mensagem (Luanda), Itinerário, Notícias do Bloqueio (Porto, 1959), O
Brado Africano, Moçambique 58; Vértice (Coimbra), Sul (Brasil).
Poeta, jornalista de
agências de notícias internacionais, viajou por toda a África durante as lutas
pela independência de vários países. Em 1975 regressou a Lisboa, onde trabalhou
na Agência Noticiosa Portuguesa.
Em 2001, a Associação
dos Escritores Moçambicanos publicou o livro Sangue Negro, que reúne a poesia
de Noémia de Sousa escrita entre 1949 e 1951. A sua poesia está representada na
antologia de poesia moçambicana Nunca mais é Sábado, organizada por Nelson
Saúte.
Obras
da Noémia de Sousa
·
Sangue Negro, Maputo,
Associação dos Escritores Moçambicanos, 2001.
·
Sangue Negro, Maputo,
Marimbique, 2011.
·
Sangue Negro, São
Paulo, Kapulana, 2016;
Enquadramento
histórico da obra “Sangue Negro”
Dentro do contexto
literário de Moçambique a autora Noêmia de Souza possui uma participação activa
na produção de poemas engajados, que questionam estruturas sociais de repressão
sobre a mulher e o processo de independência de Moçambique. Noêmia representa a
coragem da mulher africana em reivindicar seus direitos à liberdade e ao ideal
de nação africana.
Noêmia, autora
contemporânea que se consagrou como escritora da poesia combate, retrata na
poesia traços do processo de libertação política de Moçambique.
Num dos seus poemas,
os versos podem ser interpretados em visões diferentes como referência ao
feminismo, a voz poética da autora, a condição política de Moçambique e
representação de uma nação em direção a um despertar. Como característica,
Noêmia traz em sua poesia a desenvoltura das vozes narrativas que sugerem o
desejo de libertação ideológica, o discurso poético carregado de traços de
oralidade e um eu-lírico que se difunde em um grito universal.
RUI DE
NORONHA
António Rui de Noronha
nasceu na então Lourenço Marques, atual Maputo, Moçambique a 28 de Outubro de
1909. Mestiço, de pai indiano, de origem brâmane, e de mãe negra, foi
funcionário público (Serviço de Portos e Caminho de Ferro) e jornalista. O
autor colaborou na imprensa escrita de Moçambique, notadamente em O Brado
Africano, com apenas 17 anos de idade. Esta produção inicial, que se reduziram
apenas a três contos, e que correspondem ainda a uma fase de afirmação
literária, virá a ser prosseguida a partir de 1932, com uma intervenção mais
activa na vida do jornal, chegando mesmo a integrar o seu corpo directivo.
Uma desilusão amorosa,
causada talvez pelo preconceito racial, fez, segundo os seus amigos, com que o
escritor se deixasse morrer no hospital da capital de Moçambique, com 34 anos,
no dia 25 de Dezembro de 1943.
Sua obra completa está
reunida em Os meus versos, publicada em 2006, com organização, notas e
comentários de Fátima Mendonça.
Desde logo mostrou e
deixou transparecer, na sua vida e na sua escrita, um temperamento recolhido,
uma personalidade introvertida e amargurada. Foi, sem dúvida, um homem infeliz.
Nunca chegou a concretizar, em vida, o grande sonho de publicar o seu livro de
poemas. No entanto, seu professor de francês, Dr. Domingos Reis Costa reuniu,
selecionou e revisou 60 poemas para a edição póstuma intitulada Sonetos (1946),
editado pela tipografia Minerva Central.
Incluído em inúmeras
antologias estrangeiras – na Rússia, na República Checa, na Holanda, na Itália,
nos EUA, na França, na Argélia, na Suécia, no Brasil e em Portugal - Rui de
Noronha é considerado o precursor (mais jovem) da poesia moderna Moçambicana.
Obras
de Rui de Noronha
·
Sonetos (1946),
editado pela tipografia Minerva Central.
·
Os Meus Versos, Texto
Editores, 2006 (Organização, Notas e Comentários de Fátima Mendonça)
·
Ao mata-bicho: Textos
publicados no semanário «O Brado Africano» Pesquisa e Organização de António
Sopa, Calane da Silva e Olga Iglésias Neves. Maputo, Texto Editores, 2007
·
“Surge et Ambula” foi publicado em Lisboa com a publicação de 50
poetas africanos (1989)
Enquadramento
histórico da obra “Surge et Ambula”
O poema “Surge et Ambula” foi publicado em Lisboa
com a publicação de 50 poetas africanos (1989) a data de publicação original
não se sabe, mas é suposto que o poema foi escrito umas décadas antes pelo
poeta luso-moçambicano Rui de Noronha. O poema aborda os problemas contemporâneos,
vistos pelo poeta e dirige-se aos africanos adormecidos ao pedir que acordem,
vejam e resolvam as suas circunstâncias. De Noronha que era tanto português
como africano expressa no poema o mesmo senso de dualidade, das nações
moçambicana e portuguesa que ele levava dentro de si. Esse poema, portanto
admoesta uma mudança de atitude dos habitantes moçambicanos enquanto ele faz
questão sobre o significado de “ser europeu’’ ou “ser africano’’.
Conteúdo
O poema usa uma
metáfora alongada, para comparar o progresso tardio e moroso do seu povo à uma
soneca. A reiteração da palavra “Dormes!” Na primeira estrofe e a palavra
“desperta” na última fazem o papel de guiar a leitura do poema, que começa
dizendo tudo que a África perde, por estar atrasada e termina admoestando, que
ela acorde e dizendo-lhe porque é necessário.
Nas primeiras
estrofes, De Noronha contrasta a Europa e a África, dizendo que todo “progresso
caminha” em um, enquanto o outro encontra-se num “sono…infinido”. A linguagem
usada pelo autor em descrever a África faz imagem mental igual ao de Europa na
época, palavras como “mistério… fera…terra e escuridão” com a frase “A selva
faz de ti sinistro eremitério”, demonstram como foram vistos os africanos, e
como a sua inabilidade de abandonar as suas raízes “selvagens” causaria
heranças contínuas e sinistras.
Conclusão
Após várias pesquisas
e levantamento de dados, pôde chegar-se às seguintes conclusões.
Vários escritores
moçambicanos Mia Couto e Rui de Noronha marcam, marcaram de forma indelével, o
panorama da literatura moçambicana e africana em língua portuguesa, assim como
tiveram sua grande importância no processo de manifestação literária contra a
opressão que se fazia sentir em moçambique pelos colonizadores.
Sem passar despercebida,
Noêmia de Souza possui uma participação activa na produção de poemas engajados,
que questionam estruturas sociais de repressão sobre a mulher e o processo de
independência de Moçambique.
Com todos esses factos
em consideração, pode-se definitivamente afirmar a existência categórica da
literatura moçambicana e a sua importância não só entre moçambicanos, mas
também a nível mundial.
Bibliografia
·
Costa, J. e Melo, A. (1999) Dicionário
de Língua Portuguesa, 8ª Edição. Porto: Porto Editora.
- COUTO, Mia, Terra
Sonâmbula, Editorial Caminho, Portugal, 1992
·
Oliveira, Ildenes
Maria de (2013). O universo poético de
Armando Artur, Tese de mestrado, Estudos Românicos (Estudos Brasileiros e
Africanos), Universidade de Lisboa, Faculdade de Letras.
·
SALVADOR, Ângelo Domíngos. Métodos e Técnicas de pesquisa
bibliográficas. Elaboração e relatório de estudos científicos, 3ª ed.,
Porto Alegre: Sulina / Fundação de Integração, Desenvolvimento e Educação do
Noroeste do Estado (FIDENE - Ijuí RS), 1973.
·
TRIGO, Salvato. “Literatura Colonial - Literaturas
Africanas”. Literaturas Africanas de Língua Portuguesa – Colóquio sobre
Literaturas dos Países Africanos de Língua Portuguesa, Lisboa, Fundação
Calouste Gulbenkian (1987).