Grupos sanguíneos

Segundo PAULINO (2009) foi no século XX que a transfusão de sangue adquiriu bases mais científicas. Em 1900 foram descritos os grupos sanguíneos A, B e O por Landsteiner e em 1902 o grupo AB por De Costello e Starli. A descrição do sistema Rh foi posterior (1940), por Landsteiner e Wiener. Os grupos sanguíneos são constituídos por antígenos que são a expressão de genes herdados da geração anterior. Quando um antígeno está presente, isto significa que o indivíduo herdou o gene de um ou de ambos os pais, e que este gene poderá ser transmitido para a próxima geração. O gene é uma unidade fundamental da hereditariedade, tanto física, quanto funcionalmente. 


Sistema ABO

Há vários grupos sanguíneos herdados independentemente entre si. São conhecidos diversos sistemas de grupo sanguíneos. Entre eles pode-se citar os sistemas ABO, Rh, MNS, Kell, Lewis, etc. O sistema ABO é o de maior importância na prática transfusional por ser o mais antigénico, ou seja, por ter maior capacidade de provocar a produção de anticorpos, seguido pelo sistema Rh (OMS, 2012).

Ainda para a OMS (2012), os antígenos deste sistema estão presentes na maioria dos tecidos do organismo. Fazem parte deste sistema três genes A, B e O podendo qualquer um dos três ocupar o loco ABO em cada elemento do par de cromossomos responsáveis por este sistema. Os genes ABO não codificam directamente seus antígenos específicos, mas enzimas que tem a função de transportar açúcares específicos, para uma substância precursora produzindo os antígenos ABO. O indivíduo do grupo AB é possuidor de um gene A e de um gene B, tendo sido um herdado da mãe e o outro do pai. Ele possui nos seus glóbulos vermelhos os antígenos A e B, seu genótipo é AB.

No caso do grupo O, foi herdado do pai e da mãe o mesmo gene O. O gene O é amorfo, isto é, não produz antígeno perceptível. As células de grupo O são reconhecidas pela ausência de antígeno A ou B. Quando o gene O é herdado ao lado de A, apenas o gene A se manifesta; e se é herdado ao lado do gene B apenas o gene B se manifesta (OMS, 2012).


Para PAULINO (2009), os testes realizados de forma rotineira em laboratório, não podem diferenciar os indivíduos BO e BB, e nem AO e AA. Os símbolos A e B, quando referidos a grupos, indicam fenótipos, enquanto que AA, BO etc., são genótipos.



FENÓTIPO GENÓTIPO

A AO

A AA

O OO

B BO

B BB

AB AB


É dito homozigótico quando o indivíduo é possuidor de genes iguais (AA, BB, OO) e heterozigóticos quando os genes são diferentes (AO, BO, AB) (PAULINO, 2009).


2.2 A Classificação Sanguínea

Para a OMS (2012) a determinação do grupo sanguíneo deste sistema é feita usando dois tipos de testes:

1º. Através da identificação da presença de antígenos nos eritrócitos, usando reactivos compostos de anticorpos conhecidos (anti-A, anti-B, anti-AB). Esta é a chamada classificação directa.

2º. Através da identificação da presença de anticorpos no soro/plasma usando reactivos compostos de antígenos conhecidos (hemácias A e hemácias B). Esta é a classificação reversa.


GRUPO SANGUÍNEO SORO DE TIPAGEM 

Anti-A Anti-B HEMÁCIAS DE TIPAGEM 

A B ANTÍGENO ANTICORPO

A + - - + A Anti-B

B - + + - B Anti-A

AB + + - - AB Ausente

O - - + + - Anti-A e Anti-B


Regularmente as pessoas expostas a um antígeno que não possuem podem responder com a produção de um anticorpo específico para este antígeno. Entretanto, há alguns antígenos que possuem uma estrutura que se parece muito com antígenos de bactérias e planta, aos quais estamos constantemente expostos. Nestes casos, ocorre a produção de anticorpos a partir do contacto com as bactérias e plantas, e não ao antígeno eritrocitário. Neste grupo encontram-se os antígenos do sistema ABO. Por este processo, os indivíduos com idade superior a seis meses, possuem o anticorpo contra o antígeno que não tem, pois já foram expostos a essas bactérias e plantas, através da alimentação. Estes anticorpos são chamados de isoaglutininas ou aglutininas naturais.

Observando o quadro acima pode-se perceber a presença dos antígenos e anticorpos em cada grupo sanguíneo. É nesta presença ou ausência de antígenos e anticorpos que se baseia a tipagem sanguínea e a escolha do sangue a ser transfundido (PAULINO, 2009)


As transfusões podem ser:

1. Isogrupo: quando doador e receptor são do mesmo grupo ABO.

2. Heterogrupo: doador e receptor são de grupo sanguíneo diferente.


Segundo PAULINO (2009), a escolha do sangue se baseia em que o indivíduo não pode ser transfundido com um sangue que possua um antígeno que ele não tenha, pois o anticorpo presente no seu plasma, contra esse antígeno, pode reagir com essas hemácias transfundidas. Em vista disso e observando o quadro acima, fica claro que um indivíduo do grupo A não pode tomar sangue B e assim por diante. Sempre que possível deve se transfundir sangue isogrupo, pois se por exemplo, transfundimos um sangue do grupo O, a um paciente do grupo A, junto com as hemácias transfundidas temos uma quantidade de plasma onde há anticorpo anti-A, que poderá reagir com as hemácias deste paciente causando um grau de hemólise maior ou menor, mas que poderá ter um significado a depender do quadro clinico do paciente. Cada caso deve ser analisado pelo hemoterapeuta.

Este sistema ABO também pode ocasionar incompatibilidade naternofetal, com desenvolvimento da doença hemolítica peri-natal. Apresenta também importância em transplantes renais ou cardíacos, com menor papel nos hepáticos ou de medula óssea. Em alguns processos pode ocorrer a perda parcial do antígeno A ou B, como em algumas leucemias (PAULINO, 2009).

No soro, parte do plasma onde se concentram anticorpos (proteínas de defesa), são usados contra o antígeno.

B: no grupo A

A: no grupo B

Nenhum: no grupo AB

A, B, AB: no grupo O

AB: Receptor universal

O: Doador universal 



2.3 Factor Rh

Segundo PAULINO (2009), em 1940, Karl Landsteiner e Alexander Solomon Wiener realizaram experiências com o sangue do macaco Rhesus. Ao injectar sangue em cobaias, perceberam que elas produziam anticorpos, gradativamente. Concluíram que havia nas hemácias do sangue do macaco um antígeno que foi denominado de factor RH. O anticorpo produzido no sangue da cobaia foi denominado de anti-Rh. Os indivíduos que apresentam o factor Rh são conhecidos como Rh+, apresentando os genótipos RR ou Rr. 


Ao referir que o indivíduo é Rh Positivo, quer dizer que o antígeno D está presente. O antígeno D foi o primeiro a ser descoberto nesse sistema, e inicialmente foi considerado como único. Além deste, foram identificados quatro outros antígenos C, E, c, e, pertencentes a este sistema. Após os antígenos A e B (do sistema ABO), o antígeno D é o mais importante na prática transfusional (PAULINO, 2009).

Em algumas situações pode-se ter uma expressão fraca do antígeno D. Isso pode ocorrer por:

Variações quantitativas que são transmitidas geneticamente.

Efeito de posição, sendo o mais conhecido o enfraquecimento do antígeno D quando o gen C está na posição trans em relação ao D

Expressão parcial por ausência de um dos múltiplos componentes do antígeno D.


Estes casos são chamados na prática de Rh fraco e se refere ao que era conhecido anteriormente como D.

Ao contrário do que ocorre com os antígenos A e B, as pessoas cujos eritrócitos carecem do antígeno D, não tem regularmente o anticorpo correspondente. A produção de anti-D quase sempre é posterior a exposição por transfusão ou gravidez a eritrócitos que possuem o antígeno D. Uma alta proporção de pessoas D-negativas que recebem sangue D-positivo produzem anti-D.

Ao se encontrar um anticorpo desse sistema, pode-se concluir que ocorreu uma imunização através de uma transfusão ou de uma gravidez. Qualquer antígeno deste sistema é capaz de provocar a produção de anticorpos, e assim a gerar situações de incompatibilidade.

Aloimunizações contra antígenos E, c, e, C são também observadas em pacientes politransfundidos, mas com uma freqüência inferior. A maioria dos casos de Doença Hemolítica do Recém-Nascido (DHRN) é devida ao anti-D. A profilaxia por imunoglobulinas anti-D diminuiu o número de aloimunizações maternas contra o antígeno D, mas não contra E, c, e, C. Na rotina, é realizada a tipagem, apenas, para o antígeno D nesse sistema. Os outros antígenos (E, C, c, e), são determinados em situações onde ocorre incompatibilidade, e é necessário obter sangue que não possua algum desses antígenos.

A produção de anticorpos contra estes antígenos ocorre de forma semelhante a produção de anti-D. A capacidade de provocar a produção de anticorpos destes antígenos varia. Partindo do mais imunogênico, temos D > c > E > C > e.


2.4 Transfusão

Segundo a OMS (2012), para efeito de transfusão, é considerado que pacientes Rh positivos podem tomar sangue Rh positivo ou negativo, e que pacientes Rh negativos devem tomar sangue Rh negativo.

Para os pacientes D fracos existem alguns critérios a serem observados. Se o antígeno D está enfraquecido por interacção génica, estando o mesmo presente integralmente, o paciente poderá tomar Rh positivo ou negativo. Porém, nos casos em que o antígeno D está enfraquecido por ausência de um dos componentes, pode ocorrer produção de anticorpos contra o antígeno D na sua forma completa. Como rotineiramente, não identificamos a causa que leva a expressão enfraquecida do antígeno, acostuma-se a dar preferência a usar sangue Rh negativo para os pacientes Rh fraco. 

Existem situações clínicas onde é necessário avaliar o risco X benefício e fazer outras opções. Neste momento é necessário o acompanhamento do hemoterapeuta.


Tabla de compatibilidade entre grupos sanguíneos

 


Rh: não tem nas paredes da hemácia o factor Rh;

Se um Rh - doar sangue para um Rh+ , ele estará entregando hemácias lisas e nada acontece. Se um Rh + doar sangue para um Rh -, ele estará entregando uma proteína estranha (factor Rh), no soro do receptor pode haver anticorpos, assim pode ocorrer a aglutinação do sangue.


2.5 Eritroblastose Fetal

De acordo com WHALEY e WONG (1989) a eritroblastose fetal, doença de Rhesus, doença hemolítica por incompatibilidade Rh ou doença hemolítica do recém-nascido ocorre quando uma mãe de Rh- que já tenha tido uma criança com Rh+ (ou que tenha tido contacto com sangue Rh+, numa transfusão de sangue que não tenha respeitado as regras devidas) dá à luz uma criança com Rh positivo. Depois do primeiro parto, ou da transfusão acidental, o sangue da mãe entra em contacto com o sangue do feto e cria anticorpos contra os antígenos presentes nas hemácias caracterizadas pelo Rh+. Durante a segunda gravidez, esses anticorpos podem atravessar a placenta e provocar a hemólise do sangue da segunda criança. Esta reacção nem sempre ocorre e é menos provável se a criança tiver os antigénios A ou B e a mãe não os tiver.


Os anticorpos anti-Rh não existem naturalmente no sangue das pessoas, sendo fabricados apenas por indivíduos Rh-, quando estes recebem transfusões de sangue Rh+. Pessoas Rh+ nunca produzem anticorpos anti-Rh, pois se o fizessem provocariam a destruição de suas próprias hemácias (WHALEY e WONG, 1989).


Explicam ainda os autores WHALEY e WONG (1989) que no passado, a incompatibilidade podia resultar na morte da mãe ou do feto, sendo, também, uma causa importante de incapacidade a longo prazo - incluindo danos cerebrais e insuficiência hepática. A situação era tratada através da transfusão do sangue do bebe, caso este sobrevivesse, logo após o nascimento ou, mais raramente através de terapia fetal, como em 1963 - altura em que se realizou a primeira transfusão de sangue a um feto. 


2.5.1 Sensibilização Materna

Segundo CARVALHO (2001), mulheres Rh- produzem anticorpos anti-Rh ao gerarem filhos Rh+. Durante a gravidez, e principalmente na hora do parto, ocorrem rupturas na placenta, com passagem de hemácias da criança Rh+ para a circulação da mãe. Isso estimula a produção de anticorpos anti-Rh e adquirir a memória imunitária, ficando sensibilizada quando ao factor Rh. Na primeira gravidez a sensibilização é geralmente pequena e o nível de anticorpos no sangue não chega a afectar a criança. Na hora do parto, porém, a sensibilização é grande, de modo que, em uma segunda gestação, se o feto for Rh+, o sistema imunológico já está preparando e vacinado contra o factor Rh, os anticorpos anti-Rh atravessam a placenta e destroem as hemácias fetais, processo que continua no recém-nascido.


Diagnóstico

A confirmação do diagnóstico da Eritroblastose fetal pode ser realizado através de amniocentese e análise de bilirrubina no líquido amniótico. Níveis alterados de bilirrubina indicam hemólise fetal e pode haver a necessidade de transfusão intra-uterina e ou a interrupção imediata da gestação (WHALEY e WONG, 1989). 


Também pode ser diagnosticada através do Teste de Coombs Indirecto, aumento de anticorpos anti-Rh na circulação materna e o Teste de Coombs Directo, após o nascimento, pela detecção de anticorpos ligados a eritrócitos na circulação fetal, a partir do cordão umbilical.


Exames à serem realizados pelo Recém-Nascido:  

Grupo Sanguíneo e Factor Rh;

Bilirrubina total e fracções;

Entre outros. 


Exames à serem realizados pela Mãe : 

Grupo Sanguíneo e Factor Rh; 

Pesquisa de anticorpos; 

Entre outros.


2.5.2 Sintomas e Tratamento

A destruição das hemácias leva à anemia profunda, e o recém-nascido adquire icterícia (pele amarelada), devido ao acúmulo de bilirrubina, produzida no fígado a partir de hemoglobina das hemácias destruídas. Como resposta à anemia, são produzidas e lançadas no sangue hemácias imaturas, chamadas de eritroblastos. A doença é chamada de Eritroblastose Fetal pelo fato de haver eritroblastos em circulação ou doença hemolítica do recém-nascido. Se o grau de sensibilização da mãe é pequeno, os problemas se manifestam apenas após a criança nascer. Nesse caso, costuma-se substituir todo o sangue da criança por sangue Rh-. Com isso, os anticorpos presentes no organismo não terão hemácias para aglutina. Como as hemácias têm em média três meses de vida, as hemácias transferidas vão sendo gradualmente substituídas por outras fabricadas pela própria criança. Quando o processo de substituição total ocorrer, já não haverá mais anticorpos da mãe na circulação do filho (CARVALHO, 2001).


Hoje pode-se tratar com alguns antisoros anti-Rh (+) (Mathergan, Partogama ou RhoGAM - esta última também designada por imunoglobulina anti-D, em referência ao antigénio D, o mais importante antigénio do factor Rh). Nesse caso, sempre que uma mãe tenha sangue RhD negativo é necessário verificar qual é o grupo sanguíneo do bebe. Se este for Rh+, a mãe deve receber uma injecção de imunoglobulina contra o factor Rh nas primeiras 72 horas após o parto, de forma a impedir a formação dos anticorpos que poderiam criar complicações nas gestações seguintes (CARVALHO, 2001).


O Tratamento do recém- nascido é realizado conforme o grau de acometimento do RN: 

Acompanhamento clínico;

Transfusão de hemácias;

Fototerapia: utilizado no tratamento da icterícia neonatal, permite que as moléculas de bilirrubina sejam eliminadas pelos rins e fígado, através da luz que irá penetrar na epiderme e tecido subcutâneo, está, será direccionada para o tronco do recém-nascido (CARVALHO, 2001).  

3 Referências bibliográficas 

CARVALHO, Manuel De. Tratamento da icterícia neonatal. Jornal de pediatria, Vol. 77, Supl.1, 2001

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE (OMS). O Uso Clínica do Sangue: Manual de Bolso. Genebra, 2012.

PAULINO, Wilson Roberto. Biologia Atual Vol 3. Ed: Ática. São Paulo, 2009

WHALEY, Lucille F.; WONG, Donna L. Enfermagem pediátrica: elementos essenciais à intervenção efetiva. 2. Ed. Guanabara Koogan. Rio de Janeiro, 1989.


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